Provérbios
6:1-5 - ARC
1 Filho meu, se ficaste por fiador do teu
próximo, se te empenhaste por um estranho, 2 estás enredado pelos teus lábios;
estás preso pelas palavras da tua boca. 3 Faze pois isto agora, filho meu, e
livra-te, pois já caíste nas mãos do teu próximo; vai, humilha-te, e importuna
o teu próximo; 4 não dês sono aos teus olhos, nem adormecimento
às tuas pálpebras; 5 livra-te como a gazela da mão do
caçador, e como a ave da mão do passarinheiro.
Por Jânsen Leiros Jr.
O capítulo 6 de Provérbios quebra a
sequência de ensinamentos do sábio, incluindo advertências isoladas, sobre as
quais tentaremos jogar alguma luz separadamente, dada a complexidade apesar de
tamanha obviedade.
Ao reprovar o ato de assumir fiança a
terceiros, diferentemente do que faz em outros ensinamentos, o sábio aqui não
declara a motivação intrínseca de sua advertência. A "prisão" ao
compromisso é consequência do acordo de garantia, mas não chega a explicar o
sentido moral de tal orientação.
Comparando com outras ocorrências de
fiança no texto bíblico, talvez nos seja possível encontrar algumas pistas mais
adequadas, como, por exemplo, em Gênesis 43:9,
quando Judá se coloca pessoalmente como garantidor do retorno do irmão caçula, quando
da segunda viagem ao Egito para comprar alimentos. Como conhecemos o fim da
história, sua atitude talvez nos passe despercebida em meio a narrativa. Porém
Judá, por sua atitude, viu-se em apuros quando José, encenando aborrecimento
pelo suposto roubo de um de seus pertences, ameaçou manter Benjamim preso como
escravo, libertando todos os demais. Judá ofereceu sua liberdade em troca do
retorno do irmão, pois talvez não conseguisse viver com a culpa da garantia não
cumprida ao próprio pai. De modo que ter-se dado por fiador do retorno de seu
irmão, custaria a Judá a própria liberdade, sua vida em família, e
provavelmente todos os seus planos e perspectivas.
Partindo do ocorrido com Judá, talvez
o sábio queira dizer que não é possível a nenhum ser humano dar garantias sobre
a vida, o comportamento e as atitudes de qualquer outro, já que nem mesmo das
suas pode ser garantidor pleno; o bem que
quero fazer não faço, mas o mal que eu não quero, esse é o que faço, dirá
Paulo mais tarde, reconhecendo a dificuldade de alinhar a própria conduta com
seus princípios morais.
Ora, se ao homem é difícil garantir a
própria conduta por vício de atitude, inclinado que é ao pecado, como garantir
que terceiros agirão corretamente, pagando suas dívidas e honrando compromissos
firmados. Garantir atitudes de outros é, portanto, uma imprudência decorrente
da arrogância de um pretenso domínio que efetivamente não existe; o das
contingências e do imponderável. Pois ainda que o terceiro afiançado seja probo
em suas atitudes, está ele ainda vulnerável às circunstâncias e fatos, que
alheios à sua vontade, poderão impedir-lhe honrar com a dívida, transferindo
assim o compromisso e o pagamento ao seu fiador garantidor.
Comparativamente ainda, outras passagens
do texto bíblico apontam para fianças, essas sim aceitas e inquestionáveis; Jó
clama a Deus para que seja seu fiador
diante de Si mesmo, pois ninguém haveria de lhe estender a mão[1],
e Jesus, que é o fiador de Deus junto aos homens (e não o contrário),
garantindo-lhes sacerdote eterno[2].
Ainda o salmista clama a Deus que lhe seja fiador diante dos homens para o seu
bem[3].
Entendemos assim, que apenas Deus pode
afiançar, garantir, ou assumir
responsabilidades em lugar de alguém, pois o domínio de todas as coisas lhe
pertence. Ser fiador do que não podemos garantir, é partir de uma condição de
iminente descumprimento com o compromisso assumido. Não temos poder nem domínio
necessário para garantir nada; para afiançar que determinada coisa se dará
dessa ou daquela maneira.
Diante de tal imprudência, portanto, o
sábio sugere que haja grande empenho em livrar-se do compromisso assumido
indevidamente. Sem orgulho ou adiamento,
livre-se dele como quem luta pela própria vida, pois é ela que corre
perigo, caso reste ao fiador, a responsabilidade de arcar com a dívida do seu
próximo.