domingo, 20 de março de 2016

Provérbios - Lição XII; Garanto que não posso garantir



Provérbios 6:1-5 - ARC

1 Filho meu, se ficaste por fiador do teu próximo, se te empenhaste por um estranho, 2 estás enredado pelos teus lábios; estás preso pelas palavras da tua boca. 3 Faze pois isto agora, filho meu, e livra-te, pois já caíste nas mãos do teu próximo; vai, humilha-te, e importuna o teu próximo; 4 não dês sono aos teus olhos, nem adormecimento às tuas pálpebras; 5 livra-te como a gazela da mão do caçador, e como a ave da mão do passarinheiro.

Por Jânsen Leiros Jr.

O capítulo 6 de Provérbios quebra a sequência de ensinamentos do sábio, incluindo advertências isoladas, sobre as quais tentaremos jogar alguma luz separadamente, dada a complexidade apesar de tamanha obviedade.

Ao reprovar o ato de assumir fiança a terceiros, diferentemente do que faz em outros ensinamentos, o sábio aqui não declara a motivação intrínseca de sua advertência. A "prisão" ao compromisso é consequência do acordo de garantia, mas não chega a explicar o sentido moral de tal orientação.

Comparando com outras ocorrências de fiança no texto bíblico, talvez nos seja possível encontrar algumas pistas mais adequadas, como, por exemplo, em Gênesis 43:9, quando Judá se coloca pessoalmente como garantidor do retorno do irmão caçula, quando da segunda viagem ao Egito para comprar alimentos. Como conhecemos o fim da história, sua atitude talvez nos passe despercebida em meio a narrativa. Porém Judá, por sua atitude, viu-se em apuros quando José, encenando aborrecimento pelo suposto roubo de um de seus pertences, ameaçou manter Benjamim preso como escravo, libertando todos os demais. Judá ofereceu sua liberdade em troca do retorno do irmão, pois talvez não conseguisse viver com a culpa da garantia não cumprida ao próprio pai. De modo que ter-se dado por fiador do retorno de seu irmão, custaria a Judá a própria liberdade, sua vida em família, e provavelmente todos os seus planos e perspectivas.

Partindo do ocorrido com Judá, talvez o sábio queira dizer que não é possível a nenhum ser humano dar garantias sobre a vida, o comportamento e as atitudes de qualquer outro, já que nem mesmo das suas pode ser garantidor pleno; o bem que quero fazer não faço, mas o mal que eu não quero, esse é o que faço, dirá Paulo mais tarde, reconhecendo a dificuldade de alinhar a própria conduta com seus princípios morais.

Ora, se ao homem é difícil garantir a própria conduta por vício de atitude, inclinado que é ao pecado, como garantir que terceiros agirão corretamente, pagando suas dívidas e honrando compromissos firmados. Garantir atitudes de outros é, portanto, uma imprudência decorrente da arrogância de um pretenso domínio que efetivamente não existe; o das contingências e do imponderável. Pois ainda que o terceiro afiançado seja probo em suas atitudes, está ele ainda vulnerável às circunstâncias e fatos, que alheios à sua vontade, poderão impedir-lhe honrar com a dívida, transferindo assim o compromisso e o pagamento ao seu fiador garantidor.

Comparativamente ainda, outras passagens do texto bíblico apontam para fianças, essas sim aceitas e inquestionáveis; Jó clama a Deus para que seja seu fiador diante de Si mesmo, pois ninguém haveria de lhe estender a mão[1], e Jesus, que é o fiador de Deus junto aos homens (e não o contrário), garantindo-lhes sacerdote eterno[2]. Ainda o salmista clama a Deus que lhe seja fiador diante dos homens para o seu bem[3].

Entendemos assim, que apenas Deus pode afiançar, garantir, ou assumir responsabilidades em lugar de alguém, pois o domínio de todas as coisas lhe pertence. Ser fiador do que não podemos garantir, é partir de uma condição de iminente descumprimento com o compromisso assumido. Não temos poder nem domínio necessário para garantir nada; para afiançar que determinada coisa se dará dessa ou daquela maneira.

Diante de tal imprudência, portanto, o sábio sugere que haja grande empenho em livrar-se do compromisso assumido indevidamente. Sem orgulho ou adiamento, livre-se dele como quem luta pela própria vida, pois é ela que corre perigo, caso reste ao fiador, a responsabilidade de arcar com a dívida do seu próximo.





[1]  Jó 17:2-4
[2]  Hebreus 7:22
[3]  Salmos 119:122

segunda-feira, 7 de março de 2016

Provérbios - Lição XI; Sedutora sedução

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Provérbios 5:1-23

1 Filho meu, presta atenção às minhas palavras de sabedoria e inclina os teus ouvidos para compreender o meu discernimento. 2 Assim manterás o bom senso, e os teus lábios guardarão o conhecimento; 3 porquanto os lábios da mulher imoral são sedutores e destilam mel; sua voz é mais suave que o azeite, 4 contudo, no final é amarga como fel, afiada como uma espada de dois gumes. 5 Seus pés correm para a morte; seus passos conduzem-na diretamente ao inferno. 6 Ela não reflete sobre o perigo de andar por trilhas tortuosas, e não consegue enxergar o caminho da vida. 7 Agora, portanto, meu filho, dá-me ouvidos e não te desvies das palavras da minha boca. 8 Afasta o teu caminho da mulher adúltera, e não te aproximes da porta da sua casa; 9 para que não entregues aos outros a tua honra, tampouco, tua própria vida a algum homem cruel e violento; 10 para que dos teus bens não se fartem os estranhos, e outros se enriqueçam à custa do teu trabalho; 11 e venhas a te queixar e gemer no final da vida, quando teu corpo perder o esplendor e o vigor abandonar tua carne.12 Então, murmurarás: “Como me rebelei à disciplina! Como meu coração desprezou a repreensão! 13 Não quis ouvir os meus mestres, nem dei atenção aos que me ensinavam. 14 Cheguei muito próximo da ruína completa, à vista de toda a comunidade!”
15 Portanto, bebe a água da tua própria fonte, sacia tua sede com as águas que brotam do teu próprio poço. 16 Por que deixar que os teus ribeiros transbordem pelas ruas e as tuas fontes pelas praças? 17 Que tais mananciais sejam exclusivamente teus, jamais divididos com quem quer que seja! 18 Bendita seja a tua fonte! Alegra-te sobremaneira com a tua esposa. Sê feliz com a moça com quem casaste! 19 Gazela ardorosa, corsa graciosa; que os seios da tua esposa sempre te fartem de prazer, e seu amor te extasie de carinhos todos os dias de tua vida. 20 Por qual razão, filho meu, andarias descontrolado atrás de uma mulher imoral? Por que acariciar outros seios que não os de tua esposa? 21 Os caminhos do homem estão diante dos olhos do SENHOR, e Ele examina atentamente todos os seus passos! 22 Quanto ao perverso, são suas próprias iniquidades que o amarram e o fazem prisioneiro das cordas do seu pecado. 23 Com toda a certeza, ele morrerá por falta de controle; andará inseguro e cambaleante por conta de sua insensatez.

Por Jânsen Leiros Jr.

Salomão traça um dos mais contundentes e irretocáveis paralelos entre pecado e infidelidade conjugal, apresentando todo o processo de tentação e queda, comparando o pecador ao tolo que se deixa levar pela sedução de uma mulher adúltera.

Nos dois primeiros versículos ele incentiva o filho a inclinar seus ouvidos a compreender os seus entendimentos. A gastar tempo e empenho nisso. Ocupado em ouvir a voz da sabedoria e a discernir suas instruções, não haverá brecha para ouvir a sedutora voz da adúltera. E aqui há um ponto de escolha, de opção. Ou pelo que é correto, ou pelo que é errado. Porque se os lábios são sedutores como o mel, e a voz suave como o azeite, ao optar por dar-lhe ouvidos, o filho decide pelo prazer imediato e por saciar-se inconvenientemente. Não há inocência.

E aqui é importante ressaltar o caráter da sedução e a decisão por deixar-se enganar por ela. A sedução se faz naquilo que lhe é interessante. Mas não há qualquer engodo insuspeito nela. A sedução é uma espécie de convencimento de fazer algo que sabidamente não é correto, porém os riscos compensam o benefício a locupletar. O caráter provisório do que se deseja, em detrimento da perenidade do que se pode perder. Não há inocência e não há temor. Deixar-se vencer pela adúltera é um risco calculado e uma opção pra lá de consciente, e por isso plenamente imputável.

Pode parecer que uma pequena escapulida não tenha maiores consequências, mas o sábio adverte para a grande ruína que se abate sobre quem se permite a tanto. Primeiro porque o que antes era doce como mel se torna amargo, bem como o que era cicatrizante e revigorante como o azeite, se torna cortante e penetrante como a espada. O que parecia um bem se transforma em um grande mal, e seu fim é remorso e amargura. O efeito devastador do pecado. A sensação de desgosto pelo pecado cometido é tão grande que Davi dizia apodrecerem os seus ossos[1]!

Outra interessante advertência do sábio está em sugerir que o filho se afaste da adúltera e sequer se aproxime de sua porta. O motivo está nos versículos 5 e 6. Se não for você a tomar conta de si mesmo, não espere que ela o faça, pois sequer pensa ou medita sobre seu pecado e sobre o seu caminho de morte. Dá-me ouvidos e não te desvies das minha palavras. Para chegar às portas da adúltera, antes é preciso desviar-se do caminho orientado pelo pai. Não é sem querer que se vai até ela. Então não se coloque a prova. Não subestime seus impulsos. Para que arriscar-se à ruína?

Dos versículos 9 ao 13, fica clara a armadilha armada pela sedução da adúltera. Não havia qualquer intenção de lhe fazer bem. Pelo contrário a vida do tolo será completamente sugada. Sua saúde esgotada. O vigor lhe fugirá do corpo. O peso do lamento lhe envergará e ele então reconhecerá que sua desventura não foi causada por outro, senão por sua própria teimosia, desobediência e tolice. Pois não deu ouvidos ao ensino, nem sequer atentou à repreensão.

O versículo 14, no entanto, traz um alento. Há uma saída! Quando ele diz estive próximo da ruína completa, implicitamente está demonstrado que o seduzido escapou, não depois do pecado concebido, mas antes de o ter cometido, uma vez que anteviu tudo o que lhe aconteceria, por lembrar-se de tudo o que o pai lhe ensinou. Então ele diz a si mesmo: Ufa! Foi por pouco!

Há uma grande recompensa àquele que não se deixa seduzir pelo pecado, pela voz sedutora da adúltera. A vida de santidade não é uma vida abnegada de prazeres, mas antes tem prazer naquilo que recompensa a vida e não no que lhe arma perigosas armadilhas. Bebe a água da tua própria fonte, sacia tua sede em teu próprio poço. Bebe até estar satisfeito. Valoriza teus mananciais. Alegra-te, sê feliz e se farte de prazer, diz o sábio, mas com a tua mulher. Seja grato pelo que Deus te dá e pela maneira com que vives, pois isso é a porção da vida que o Senhor te deu. A sedução do pecado normalmente nos assalta quando partimos para desejar aquilo que não nos pertence, ou não nos convém.

Por fim, o sábio afirma que o perverso se amarra em suas próprias iniquidades e se aprisiona em seu pecado. Ele morrerá por seu descontrole, ou viverá cambaleante pela insensatez em desprezar o ensino. E não adianta se declarar inocente ou enganado por desconhecer a sabedoria. Deus conhece e examina atentamente todos os passos do homem. Nada lhe é escondido ainda que fingido.




[1]  Salmos 32:3

sexta-feira, 4 de março de 2016

Provérbios - Lição X; Atenção às suas escolhas



Provérbios 4:20-27

20 Filho meu, dá atenção às minhas instruções; aos meus conselhos inclina os teus ouvidos. 21 Jamais os percas de vista; guarda-os no mais íntimo das tuas entranhas, 22 pois são vida para quem os encontra e saúde para todo o seu ser. 23 Acima de tudo o que se deve preservar, guarda o íntimo da razão, pois é da disposição do coração que depende toda a tua vida. 24 Afasta para longe da tua boca as palavras perversas; e não permitas que teus lábios pronunciem qualquer mentira. 25 Olha sempre para a frente, mantém teu olhar fixo no objetivo a ser alcançado. 26 Reflete sobre tuas escolhas e sobre o caminho por onde andas, e todos os teus planos serão bem sucedidos! 27 Não te desvies nem para a direita nem para a esquerda; retira o teu pé da malignidade!

Por Jânsen Leiros Jr.

Guarda as instruções, internalize-as. Como se fizessem parte do próprio corpo. Como sendo fisiologicamente delas dependentes. Vivesse Salomão nos dias de hoje, diria para incluí-las em nosso código genético, em nosso DNA. Pois elas podem nos garantir saúde e longevidade. Podem garantir qualidade de vida, objeto de desejo tão na moda um nossos dias.

Uma advertência nova ganha importância. O íntimo da razão refere-se às motivações de nossos sentimentos, pretensões e projetos para a vida. Aponta ainda para um sentimento convicto, que não deve se guiar por circunstâncias, mas se manter convicto naquilo que pulsou originalmente. É dele que os objetivos da vida e os sonhos se alimentam. Que nossas motivações sejam legítimas.

Mas também é muito importante não permitir que o coração seja tomado por sensações perversas e maliciosas. Porque a boca fala do que está cheio o coração. De modo que a única forma de evitar que os lábios profiram mentiras e qualquer sorte de maldade, é mantendo-o guardado nas instruções da sabedoria.

Convicto e legitimado em nossos projetos, podemos e devemos olhar para frente, na direção de nossa realização. Sem temer futuro. Sem autopiedade ou vergonha. Olhando para frente e não estando cabisbaixo, é possível avaliar o caminho e pesar as possibilidades. Olhando para frente e não se permitindo distrações que nos façam olhar para os lados e caminhar fora do caminho. 

Não erre o alvo. Não trilhe o caminho do mal. Desviar-se já seria por si só o erro e o mal a ser evitado. Distrair-se é dar chance ao fracasso

quarta-feira, 2 de março de 2016

Provérbios - Lição IX; Escolhendo caminhos



Provérbios 4:10-19

10 Ouve, filho meu, e aceita as minhas palavras, e se te multiplicarão os anos de vida.11 No caminho da sabedoria, te ensinei e pelas veredas da retidão te fiz andar.12 Em andando por elas, não se embaraçarão os teus passos; se correres, não tropeçarás.13 Retém a instrução e não a largues; guarda-a, porque ela é a tua vida.14 Não entres na vereda dos perversos, nem sigas pelo caminho dos maus.15 Evita-o; não passes por ele; desvia-te dele e passa de largo;16 pois não dormem, se não fizerem mal, e foge deles o sono, se não fizerem tropeçar alguém;17 porque comem o pão da impiedade e bebem o vinho das violências.18 Mas a vereda dos justos é como a luz da aurora, que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito.19 O caminho dos perversos é como a escuridão; nem sabem eles em que tropeçam.

Por Jânsen Leiros Jr.

O autor de Provérbios continua a exaltar o legado que a sabedoria deixa para a vida, mas agora traduzindo-a em prudência. A sabedoria torna o indivíduo prudente. A prudência garante vida longa e tranquilidade, porque afasta-nos de circunstâncias perigosas. Porém tanto quanto a sabedoria, a prudência tem sido fortemente desprezada pela sociedade.

Tem sido muito comum testemunhar pessoas se vangloriarem por suas ousadias. Parece que tem havido uma premiação social intensa ao comportamento ousado, temerário, e por assim dizer imprudente. Afinal, você só deve se arrepender daquilo que não fez, dizem os pseudo sábios de plantão. Não é isso que nos tentam fazer acreditar? Que tudo tem de ser experimentado ou testado? O sábio diz o contrário. Evita-o; não passes por ele; desvia-te dele e passa de largo. Não há e nunca houve qualquer necessidade de se experimentar aquilo que sabidamente não traz qualquer benefício. Ou será que alguém anda experimentando veneno para saber se realmente mata?

É preciso, contudo, não confundir imprudência com confiança. Agir confiadamente, com responsabilidade de quem já mediu consequências, já ponderou alternativas e possibilidades, é ótimo e faz a vida avançar. A falta de confiança, inclusive, pode paralisar a vida, pelo medo que nos faz encruar. Mas prudência também não é inércia. É antes avaliar circunstâncias, medir os passos, agir com certa dose de cuidado e por que não dizer, sabedoria. É plenamente possível ser confiante e prudente em um só ato, assim como é possível ser imprudente ao insistir numa inércia ou em um medo paralisante de graves consequências.

Há um alerta extenso de que a imprudência e a tolice, a impulsividade e a violência, ainda que aparentemente tragam bons resultados, pois de imediato usufruem daquilo que indevidamente conquistam, trarão tropeço repentino. São como a escuridão, porque essa se abate repentinamente. Basta que a luz se apague.

No sentido inverso, Salomão afirma que o caminho do justo não é mágico. Não traz retorno imediato. Ele é um caminho de paciência de vivência e experimentação. Que vai clareando devagar até ser dia perfeito. Até que seu brilho intenso se apresente pleno, porém consistente e sustentado. É preciso ser convicto da sabedoria e da prudência, aguardando ser o dia perfeito. 

Portanto a sabedoria é o fiel da balança, que orientará o caminho, à medida que confiança e imprudência se confundam nas bifurcações da vida.